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Para a realeza, os bolos de casamento são muito mais que a peça central do ‘Café da Manhã de Casamento’ – recepção que acontece após a cerimônia, eles são um singelo ato de simbolismo e diplomacia. Um bolo feito para um casal real costuma ser grande o suficiente para servir mais de 2.000 pessoas, com fatias embaladas e enviadas a instituições de caridade e organizações próximas a eles, além das porções oferecidas aos convidados presentes.

Cada detalhe é pensado por chefs das melhores confeitarias do Reino Unido para apresentar designs que pretendam homenagear o país, refletir a personalidade do casal e o significado da união; uma tradição que remonta ao casamento da Rainha Victoria, em 1840.

Após a elaboração dos desenhos, os confeiteiros passam inúmeras horas construindo camadas e estruturas, geralmente montadas no local da comemoração, uma vez que os bolos de casamento reais ao longo da história costumam pesar entre 100 e 230 quilos. 

No Reino Unido, as decorações suntuosas escondem um bolo de frutas excessivamente doce e denso, preparado com frutas cristalizadas embebidas em rum ou conhaque. O álcool atua preservando naturalmente o bolo por décadas. 

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Aqui você pode acessar um infográfico especial com a versão resumida das informações disponíveis neste artigo/ lista.

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Rainha Victoria e Príncipe Albert

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Litografia colorida à mão do bolo de casamento da Rainha Victoria e do Príncipe Albert (The Royal Collection Trust).

A Rainha Victoria se casou com o Príncipe Albert de Saxe-Coburgo e Cotha (mais tarde príncipe consorte) em 10 de fevereiro de 1840, na Capela Real do Palácio de St. James, em Londres. Foi o primeiro casamento de uma rainha inglesa reinante em 300 anos. Graças ao casamento real, os bolos de casamento se tornaram mais comuns em recepções em todo o país. 

Descrito como “pesado e elegante“, o bolo de Victoria e Albert foi realizado pelo Confeiteiro Yeoman do Palácio de Buckingham, Sr. John Chichester Mawditt, e desenhado por WB Sarsfield Taylor, curador da Living Model Academy. Foi chamado de “bolo da própria rainha“, devido à influência de Victoria na criação. A rainha estabeleceu o padrão para bolos de casamento brancos, símbolo de pureza e luxo [o açúcar branco refinado era excessivamente caro na Grã-Bretanha na era vitoriana, daí o nome glacê real]  e esculturas de açúcar comestível. 

Embora  fosse totalmente inglês por dentro, composto ameixa e outras frutas, o doce era coberto de diversos toques franceses. Pesava 136 quilos, possuía  35 centímetros de altura e um metro de diâmetro.  Por mais de um século, os doceiros tomaram emprestado elementos da arquitetura grega, romana, barroca, gótica e renascentista para desenvolver projetos extraordinários.

Antes do Café da Manhã de Casamento [como é chamada a recepção] no Palácio de Buckingham, ainda na confeitaria, uma grande multidão fez fila para conseguir ver, mesmo que de muito longe, a obra de arte comestível. 

“Foi espetacular, criou um frenesi na mídia, o início de uma tradição britânica: em vez de comer o bolo ou mesmo vê-lo pessoalmente, grande parte da sociedade britânica aprendeu sobre ele olhando para ilustrações luxuosas e lendo relatos de primeira mão publicados em jornais”.

Uma litografia colorida à mão: ‘ Royal Wedding Cake, Her Most Gracious Majesty Queen Victoria and His Royal Highness Prince Albert, Married February 10 1840 ‘, mostra que o bolo foi  decorado com flores de laranjeira, para combinar com a coroa/tiara de flores simples da rainha, e salpicado com murtas.

Na gravura, bonecos da Rainha Victoria e o Príncipe Albert podem ser vistos no topo do bolo, de mãos dadas e vestindo trajes gregos. Victoria está segurando um cetro e abaixo dos noivos estão vários cupidos alados carregando o brasão de armas real da Inglaterra. Um dos cupido tem um livro aberto, no qual foi inserida a data do casamento. Há pombas aos pés da Rainha para denotar “felicidade” e um cachorro, provavelmente cachorro de estimação de Albert, Eos, aos pés do príncipe para representar a fidelidade.

Na noite de seu casamento, a jovem rainha escreveu:

Como posso ser grata o suficiente por ter um  marido assim! … Ser chamada por nomes de ternura, que nunca tinha escutado para mim antes – foi uma felicidade inacreditável! Oh! Este foi o dia mais feliz da minha vida!

O casal teve nove filhos, a maioria dos quais casados com outras famílias reais da Europa.

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Rei Edward VII e Rainha Alexandra

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O Bolo de Casamento do Príncipe e da Princesa de Gales exibido na State Drawning Room, em Windsor, 1863. (The Royal Family).

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O herdeiro da Rainha Victoria, Príncipe Albert Edward, Príncipe de Gales e futuro Rei Edward VII, se casou com a Princesa Alexandra da Dinamarca na Capela de Saint George, no Castelo de Windsor, em 10 de março de 1863. 

O Café da Manhã de Casamento foi servido para cerca de 500 pessoas, em duas salas do Castelo de Windsor. A State Drawning Room foi reservada para familiares e amigos, enquanto a St. George’s Hall foi destinada a funcionários, políticos, diplomatas e outros convidados.

Os noivos escolheram dois bolos de frutas cobertos com glacê real branco para celebrar a data, um para cada local. 

O da State Drawning Room foi criado pelo confeiteiro da Rainha Victoria, M. Pagniez, que optou por um  formato octogonal em estilo arquitetura, com aparência  altar/catedral, ornamentado por anjos e cupidos, flores e folhas, além de um buquê de flores do topo.

O da St George’s Hall, também em formato octogonal, foi descrito como “de proporção colossal”. Elaborado pelos confeiteiros reais Srs. Bolland, de Chester, exibia os brasões de armas entrelaçados do Príncipe de Gales, da nova Princesa de Gales, da Grã Bretanha e da Dinamarca.

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O Bolo de casamento do Príncipe e da Princesa de Gales exibido na St George’s Hall, em Windsor, 1863. (Pinterest).

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A base foi adornada com flores de laranjeira, jasmim, cardo e trevo.  Nas camadas, foram colocadas alternadamente miniaturas de anjos [cupidos e serafins] segurando  harpas e bandeiras de cetim, nas quais estavam pintadas figuras do príncipe e da princesa.  No topo, havia o símbolo do Príncipe de Gales: uma pequena coronet com três penas de avestruz. 

Apesar de ser conhecida como “o bolo de três andares”, a obra media quase um metro e meio de altura.  

A última fatia de um dos bolos de casamento Edward e Alexandra, provavelmente o da State Drawning Room, está disponível para compra por 32 mil libras esterlinas. A mensagem gravada no cartão dentro caixinha original em que o bolo está armazenado é a seguinte:

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O único pedaço sobrevivente conhecido do bolo de casamento real do casamento do Príncipe e da Princesa de Gales em 1863. (The Britsh Antique Dealer’s Association).

UM PEDAÇO DO BOLO DE CASAMENTO DO PRÍNCIPE E DA PRINCESA DE GALES 

10 de março de 1863

Apresentado ao

SR W.S. CHARLES

por Lady Edward Cust

O marido de Lady Cust, Sir Edward Cust, foi o Mestre de Cerimônias do casamento. A ligação do Sr. WS Charles com os noivos ou a família Cust é desconhecida, mas presumivelmente ele não foi convidado.

A caixinha é constituída  de metal dourado e ouro 18 quilates [supostamente confeccionada pelos ourives da Garrads],  encomendada especialmente para o Senhor Charles por Lady Cust como uma lembrança para comemorar o evento real.

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Rei George V e Rainha Mary

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Um dos bolos de casamento do Duque e da Duquesa de York, em 1893. (Pinterest).

Em 6 de julho de 1893, outro casamento real de um herdeiro ao trono foi celebrado, desta vez na Capela Real, no Palácio de St. James, entre o Príncipe George e a Princesa Mary de Teck, futuros George V e Rainha Mary.

O magnífico bolo de casamento oficial do Duque e da Duquesa de York era de três andares e apresentava uma decoração majoritariamente floral altamente ornamental, incluindo rosas brancas, samambaias, Lover’s Knot [conhecidos como nós do verdadeiro amor] pratas, escudos e os monogramas da noiva e do noivo. O Café da Manhã de Casamento, para cerca de 400 convidados, foi realizado no Palácio de Buckingham.

O confeiteiro real, Sr. Ponder, explicou ao jornalista Framley Steelcroft, da revista The Strand, em janeiro de 1895, que o bolo de George e Mary foi o maior e mais importante desafio da carreira dele: 

“Uma das perguntas mais importantes que fiz ao Confeiteiro Real por ocasião da minha visita a ele no Palácio de Buckingham, referia-se ao dia do casamento mais importante, do seu ponto de vista. O Sr. Ponder respondeu, sem hesitar, que o casamento do Duque de York com a princesa May [apelido de Mary] representou, de longe, a maior tensão para ele. 

O bolo foi feito em Windsor;  media 1,86 metros de altura e pesava entre 2cwt.  e 3cwt [cerca de 250 quilos].  Demorou cinco semanas para ficar pronto e precisou de trinta e nove formas separadas de gesso para alguns dos moldes dos enfeites.  

Ao todo, o Sr Ponder assou seis “bolos imensos” para a “mesa geral’‘ dos convidados, e, além desses, dezoito somente para cortar. Foram cortadas nada menos que 500 fatias de bolo de casamento, a menor pesando cerca de meia libra [200 gramas] e a maior, pouco mais de 12 libras [5,5 quilos]. 

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O Segundo bolo de casamento do Duque e da Duquesa de York, em 1893. (Pinterest).

O segundo bolo foi criado pelos Srs. Bolland, sob a ordem pessoal do Príncipe e da Princesa de Gales.  Possuía 1,8 metros de altura e pesava cerca de 100 quilos. 

Os adornos representavam a vida de marinheiro do Príncipe George.  As divisões entre os andares foram ocupadas por quatro grandes painéis representando os H.M.S.  Thrush e Melampus [navios da frota real], modelados em relevo baixo, a partir de fotografias.  

Na tarde anterior ao casamento, o bolo foi enviado de Chester [local da padaria],   para o Palácio de Buckingham.  Contudo, às três horas da manhã do dia da festa, os padeiros do Royal Chester receberam um telegrama, pedindo que removessem tudo para a Marlborough House, próxima ao Palácio de St James – o que não seria fácil, mesmo em circunstâncias mais favoráveis. 

A estrutura ornamentada foi desmontada e as camadas colocadas em dois caixotes, provavelmente os únicos meios de transporte disponíveis para atravessar as ruas lotadas de Londres. Framley Steelcroft relata que  os confeiteiros contaram que uma multidão crescente se aglomerava, pressionava e quase derrubava as caixas até que eles finalmente chegaram ao destino:   

“Essa provação finalmente acabou, entretanto, e disseram-me que o próprio Príncipe de Gales supervisionou a reconstrução do bolo na Banqueting Room [Sala de Banquetes].”

 

Longe de Londres, a Escócia contratou os Srs. McVitie e Price, de Edimburgo, para produzirem outro enorme bolo de casamento, também de caráter naval.  A estrutura tinha 1,8 metros de altura e a circunferência da base era de quase 2,5 metros. 

Tudo foi desenvolvido por uma grande equipe.  As flores da decoração e o arranjo do suporte foram confiados a uma famosa empresa de comerciantes de seda da Regent Street, e trinta trabalhadores qualificados foram empregados na fabricação do presente, preparado em sete dias.

O bolo foi exibido por dois dias em Edimburgo e despertou grande interesse da população. Mais de 14 mil pessoas passaram para observar “o grande bolo escocês”  e um time de policiais teve de ser nomeado para manter a fila em movimento e garantir que todos tivessem a oportunidade de contemplar a vitrine.  

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Rei George VI e Rainha Elizabeth

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O Bolo de casamento do Príncipe Albert e Lady Elizabeth Bowes-Lyon, em 1923. (Popperfoto/Getty Imagens, via Pinterest)

Os então Príncipe Albert e Elizabeth Bowes-Lyon, mais tarde George VI e Rainha Elizabeth [A Rainha Mãe], se casaram em 26 de abril de 1923 na Abadia de Westminster. No casamento, o casal foi nomeado Duque e Duquesa de York, título que mantiveram até a abdicação do Rei Edward VIII em 1936. 

Para a recepção, o casal escolheu um cardápio totalmente francês, preparado pelo chef Gabriel Tschumi, que também serviu como chefe de cozinha da Rainha Victoria, do Rei Edward VII e do Rei George V. O menu estava na moda nos anos 1920, período que valorizava muito a cultura francesa.

O bolo criado pela Huntley & Palmers, fábrica de doces, biscoitos e padaria em Berkshire, ao contrário do cardápio, era predominantemente inglês e escocês, projetado para refletir a ancestralidade de Lady Elizabeth e do Príncipe Albert. A obra media três metros. 

A base incluía dois leões de açúcar inspirados nas esculturas na lareira do refeitório do Castelo de Glamis [casa de infância da Rainha Mãe], uma mini reprodução do Castelo de Windsor e uma da Capela de Saint George. O segundo andar exibia três pequenos painéis contendo: o brasão da família Strathmore [condado do pai de Elizabeth, Claude Bowes-Lyon], o brasão da Força Aérea Real e a Coroa Naval, além de uma cópia em relevo do Castelo de Glamis. 

O terceiro nível contava com minúsculos cupidos tocando sinos, uma miniatura de um relógio de sol dos jardins de Glamis e escadas em prata. A camada superior representava uma torre feudal, em torno da qual estavam listadas as dezoito famílias com as quais os ancestrais de Lady Elizabeth Bowes-Lyon estavam ligados pelo casamento. No topo, havia um vaso de prata contendo um buquê de rosas York [símbolo da região e da casa de York]. 

Apesar do Príncipe Albert não ser o herdeiro ao trono na época, a criação chamou tanta atenção ao ser exibida em Reading, que um ano depois, em 1924, foi exibida na Exposição do Império Britânico.

A nova tecnologia da época permitiu que o bolo fosse o primeiro a ser filmado e apresentado ao mundo. O vídeo ainda faz parte dos arquivos da atual British Pathé, antiga Pathé News, produtora de cinejornais e documentários no Reino Unido entre 1910 a 1970. O fundador da empresa, Charles Pathé, foi um dos pioneiros do cinema mudo.

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O bolo de casamento de Albert e Elizabeth filmado pela British Pathé

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O bolo do casamento real é um triunfo da arte do confeiteiro. Reading, Berkshire.

Uma olhada no bolo de casamento ornamentado feito para o Príncipe Albert e Elizabeth Bowes-Lyon. 


A câmera começa no topo do bolo com o que parece ser folhagem e desce lentamente pelos quatro andares. É muito grande e ornamentado, em parte tem a forma de um castelo com ameias [abertura, no parapeito das muralhas de um castelo ou fortaleza], também tem pilares e figuras esculpidas nele. As pessoas fazem fila para ver.”

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Rainha Elizabeth II e Príncipe Philip

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A equipe de confeiteiros terminam de decorar o Bolo de casamento da Princesa Elizabeth e do Duque de Edimburgo, em 1947. (The Royal Family/Pinterest).

O Café da Manhã de casamento da Princesa Elizabeth e do Príncipe Philip ocorreu em 20 de novembro de 1947, poucas horas depois da cerimônia religiosa na Abadia de Westminster. O local escolhido foi a Ball Supper Room, no Palácio de Buckingham. Foram convidadas 146 pessoas, que incluíram membros da realeza da Grécia, Dinamarca, Iraque, Noruega, Romênia, Espanha, Iugoslávia e Suécia. 

Embora o casal tenha recebido onze bolos de casamento como presente, havia um oficial, feito pela padaria McVitie e Price, responsável também pelos bolos de George V e a Rainha Mary em 1893 e de George VI e a Rainha Elizabeth em 1923.

A criação possuía 2,7 metros de altura, pesava 410 quilos e produziu 2.000 fatias, entregues para convidados, instituições de caridade e organizações espalhadas pelo mundo. Um andar foi mantido para o batismo do Príncipe Charles, pouco mais de um ano depois, em dezembro de 1948. 

Em virtude da celebração ter ocorrido apenas dois anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, vários itens ainda estavam sujeitos a racionamento e alguns ingredientes  foram enviados de diversos países, incluindo o açúcar, que veio da Australian Girl Guides Association. Cada caixa era devidamente numerada e etiquetada como “INGREDIENTES HRH PRINCESA ELIZABETH”. Como resultado, o bolo foi apelidado de “Bolo de 10 mil milhas”.

A matéria jornalística da British Pathé (em inglês), intitulada “Padeiros preparam um bolo de casamento real para a Princesa Elizabeth”, mostra o bolo sendo assado e aborda brevemente a escassez de ingredientes.

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Uma matéria jornalistica da British Pathé sobre a preparação do bolo na padaria responsável pelo bolo em Reading, Inglaterra.

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A decoração apresentava o brasão de armas das famílias dos noivos, distintivos regimentais, navais, o monograma de Elizabeth e Philip e símbolos em açúcar para retratar os passatempos prediletos e cenas da vida do casal. O bolo continha ainda sapatos revestidos de prata, grandes o suficiente somente para caber em um buquê de flores em miniatura no dedo do pé. Um exemplo de um desses minúsculos sapatos prateados sobreviveu na Royal Collection. 

O bolo oficial e os outros onze oferecidos à princesa foram exibidos na Blue Drawing Room, do Palácio de Buckingham, e depois enviados a museus do Reino Unido para exibições especiais, sempre lotadas. Uma das exposições foi filmada:

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Vídeo da Britsh Pathé: “REALEZA: Casamento de Sua Alteza Real a Princesa Elizabeth e Philip Mountbatten: bolo de casamento em exibição (1947).”

Para comemorar o 70º aniversário de casamento da Elizabeth e Philip, a Le Cordon Bleu de Londres foi convidada a recriar o bolo do casal para o documentário “A Very Royal Wedding”, da ITV, transmitido em 30 de outubro de 2017.

A equipe da Le Cordon Bleu posa em frente a réplica do bolo de casamento da Rainha Elizabeth II. (Por Harry Page/ Le Cordon Bleu Londres).

O projeto foi comandado pelos chefs Julie Walsh e Matthew Hodgett, com o apoio do setor de Pâtisserie do instituto e alunos, que passaram meses pesquisando, assando e decorando um bolo de quatro andares para combinar com o original de 1947. Toda a equipe ficou impressionada com a quantidade de ingredientes necessária: 28 quilos de manteiga; 25 quilos de açúcar (apenas para a massa); 750 ovos, 160 laranjas, 80 limões e três litros de rum da marinha.

Com base em arquivos, vídeos e fotografias, o bolo de frutas foi meticulosamente replicado sob medida, do glacê real branco a todos os enfeites complicados.

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Montagem para comparação do bolo original e a réplica da Le Cordon Bleu feita pela revista Food & Wine.

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Príncipe Charles e Princesa Diana

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O chef David Avery posa em frente ao bolo de casamento do Príncipe e da Princesa de Gales, em 1981. (Pinterest).

O Príncipe de Gales, Príncipe Charles, e Lady Diana Spencer trocaram votos na Catedral de St Paul, em Londres, em 29 de julho de 1981, no que foi considerado “o casamento do século XX”. 

Apesar de 750 milhões de pessoas ao redor do mundo terem assistido a cerimônia, somente os convidados puderam ver qualquer detalhe da recepção. Supostamente, o Café da Manhã de Casamento contava com 27 bolos e apenas um era oficial:  a criação de David Avery, padeiro-chefe da Royal Naval Cookery School. 

Charles e Diana optaram por um bolo de frutas britânico clássico, ao mesmo tempo em que trouxeram uma grande inovação, uma cobertura  cream cheese ao invés dos tradicionais glacê real e pasta americana. 

A obra de David Avery media um metro e meio de altura, pesava mais de 90 quilos e demorou quatorze semanas para ficar pronta. Cada camada assumia a forma de um pentágono, que diminuíam lentamente até o topo. 

Para separar os andares, foram inseridas colunas romanas. O efeito geral era inspirado pelas pirâmides natalinas alemãs. O aspecto com colunas influenciou os bolos de casamento britânicos e americanos por décadas.

A decoração era minimalista, composta por pequenos detalhes artísticos em pinturas, que incluíam o brasão das duas famílias, o símbolo do Príncipe de Gales, do País de Gales,  edifícios significativos para o casa, pelas iniciais C & D e um grande arranjo de flores no topo.

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Imagem da fatia de bolo de casamento do Príncipe de Gales e de Diana, Princesa de Gales, leiloada em 2017. ( The Mirror).

Um pedaço do bolo foi leiloado em 2017 na embalagem original, uma caixinha branca  prata, com o desenho das três penas, símbolo do Príncipe de Gales, o monograma de Charles e Diana “C D”, e a inscrição:

PALÁCIO DE BUCKINGHAM 

29 DE JULHO DE 1981

O cartão-presente original, trazia a mensagem: 

“Com os melhores votos de  Suas Altezas Reais, O Príncipe e a Princesa de Gales”.

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Príncipe Charles e Camilla Parker-Bowles

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A senhora Etta Richardson segura um de seus famosos bolo de fruta, em 2005. (The Royal Family/ Getty Images).

O bolo escolhido para o casamento do Príncipe Charles e Camilla Parker Bowles tem uma história especial. Em 2004, o Príncipe de Gales visitou uma pequena exposição de sociedades e organizações associadas à aldeia galesa de Llansteffan, e provou um pedaço do bolo de frutas de uma confeiteira local, Etta Richardson, uma senhora de 74 anos na época. 

O príncipe ficou tão impressionado que afirmou que era “o bolo mais gostoso que já havia provado”. Alguns meses depois, Charles a convidou a recriar o bolo para uma ocasião especial: a recepção de casamento do Príncipe de Gales e da Duquesa da Cornualha, realizada em Windsor em 9 de abril de 2005. 

A família Richardson ainda administra um pequeno negócio na cozinha de casa e continua a vender a sobremesa, agora chamada de ‘Bolo Real da Etta‘, no mercado de Camarthan.

Charles e Camilla escolheram ainda um segundo bolo, feito pela chef Dawn Blunden, dona da confeitaria Sophisticake, em Woodhall Spa, Lincolnshire, no Reino Unido. 

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O segundo bolo de casamento do Príncipe de Gales e da Duquesa da Cornualha, feito pela chef Dawn Blunden, em 2005. (Pinterest).

A cobertura era de pasta americana e os adereços eram todos em glacê real. Os brasões reais do príncipe, rosas, narcisos, cardos e as letras CC, representando Charles e Camilla, adornavam o bolo quadrado de apenas dois andares.

Mais de 2.500 fatias extras foram produzidas para serem distribuídas em embalagens coloridas como lembrança do grande evento.

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Uma das fatias de bolo distribuídas como lembrança pelo Príncipe de Gales e da Duquesa da Cornualha. (Julien’s Auctions).

SAR O PRÍNCIPE DE GALES

SAR A DUQUESA DA CORNUALHA 

9 DE ABRIL DE 2005

O cartão dentro da caixa trazia uma pequena mensagem escrita em letras verdes: 

“Com os melhores desejos do SRA O Príncipe de Gales e SAR A Duquesa da Cornualha.”

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Príncipe William e Kate Middleton

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A confeiteira Fiona Cairns posa em frente ao bolo de casamento criado para o Duque e a Duquesa de Cambridge em 2011. (Getty Images).

O casamento real mais assistido da história, por mais de um bilhão de pessoas, aconteceu em 29 de abril de 2011 na Abadia de Westminster, em Londres, quando a jovem plebeia Catherine Middleton se casou com o herdeiro ao trono, Príncipe William, e se tornou Duquesa de Cambridge e futura rainha. No entanto, os preparativos para a cerimônia começaram meses antes. 

A encomenda para a confeiteira escolhida para criar o bolo de casamento, Fiona Cairns, foi fechada em 18 de fevereiro. Em entrevista à revista Town and Country de abril de 2021, Fiona descreveu a experiência: 

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“Assim que fomos contatados, desde o momento do telefonema, eu passava noites sem dormir. Tínhamos que continuar nos beliscando. É uma parte muito importante do casamento real e foi a maior e mais importante missão que nós, como empresa, já recebemos.”

“Percebemos que era um grande privilégio estarmos sendo considerados para fazer o bolo de casamento do futuro rei e rainha da Inglaterra. E foi uma responsabilidade enorme desde o início”. 

Fiona Cairns

A Família Real divulgou um comunicado à imprensa em 27 de março de 2011,  revelando detalhes sobre o futuro bolo: 

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“O Príncipe William e a Srta. Catherine Middleton escolheram a designer de bolos de Leicestershire, Fiona Cairns, para criar seu bolo de casamento.

O bolo de casamento será um bolo de frutas tradicional de vários andares. O bolo, que será decorado com glacê [nas cores] creme e branco, terá um forte tema floral britânico utilizando elementos da técnica de Joseph Lambeth [O método Lambeth é derivado de um estilo de decoração popular na Inglaterra, onde chefs usam glacê real para formar arabescos em 3D, folhas, flores e outros ornamentos em um bolo]. Fiona foi escolhida por seu estilo criativo e bolos artesanais lindamente confeccionados com ingredientes tradicionais britânicos. Seu negócio, iniciado há 25 anos em sua mesa de cozinha, agora é baseado em uma padaria de última geração em Leicestershire, no coração do interior da Inglaterra.”

Ainda durante entrevista à Town and Country, a chef Fiona explicou como a Duquesa de Cambridge teve papel importante nas decisões criativas:

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“Foi um processo maravilhoso. De muitas maneiras, eu diria que Kate desenhou seu bolo de casamento, porque ela sabia muito claramente o que queria e o que não queria. As ideias vieram dela, tivemos reuniões com ela e o briefing era da Kate. Ela nos deixou absolutamente à vontade, ela é tão natural e adorável como todos nós a vemos na mídia.”

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A equipe de 50 confeiteiros de Cairns passou cinco semanas moldando 900 flores de pasta de açúcar para enfeitar o bolo. Inspirados pela linguagem vitoriana das flores [determinante também na composição do buquê da noiva], William e Kate escolheram 17 espécies, cada uma com significado especial.

As principais eram uma homenagem às quatro nações que compõem o Reino Unido. A rosa (branca) da Inglaterra, o narciso do País de Gales, o trevo da Irlanda do Norte e o thistle (cardo), da Escócia.

As outras flores escolhidas foram as acorns [bolotas e folhas de carvalho], para representar força e resistência; murta (amor), hera (amor e casamento), lírio do vale (doçura e humildade), rosa nupcial (amor e felicidade), Sweet William (bravura, sorriso e delicadeza), madressilva (vínculo do amor), flor de macieira (abundância), urze branca (proteção, desejos se tornarão realidade), jasmim branco (felicidade conjugal), margarida (inocência, beleza e simplicidade), flor de laranjeira (pureza e fertilidade) e lavanda (devoção, sucesso e sorte).

A montagem do bolo na Galeria de Fotos no Palácio de Buckingham demorou três dias. Na época, logo após dar os retoques finais na obra, Fiona Cairns relatou: 

“A Galeria de Fotos tem tetos altos e é uma sala imponente, então eu queria que o bolo tivesse presença, mas não fosse imponente e acho que funcionou. Catherine não queria que tivesse mais de dois metros de altura, ela não queria que fosse alto e fino, e acho que conseguimos. Refletimos alguns dos detalhes arquitetônicos na sala, de modo que as guirlandas nas paredes foram reproduzidas livremente na quarta camada.

O resultado final foi um bolo de oito andares, cem quilos e um metro de altura por um metro de largura. Além das flores, a decoração incluía uma guirlanda no topo e o monograma de William e Catherine [as iniciais W e C entrelaçadas]. Cairns recebeu um pedaço da renda do vestido de casamento da duquesa, que foi copiada em glacê e pasta americana. 

Vídeo detalhado da ITN News do bolo de casamento do Duque da Duquesa de Cambridge em exibição no Palácio de Buckingham e uma pequena entrevista (em inglês), com Fiona Cairns.

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Curiosamente, o bolo que foi exposto, não foi servido no casamento, permaneceu em exposição no palácio. Cairns e diversos trabalhadores cortaram 600 fatias separadas para o Café da Manhã de Casamento, em 29 de abril. Outras 4.000 foram enviadas pelo Príncipe de Gales em latas para presente, como de costume. 

William e Kate ainda tiveram outro bolo de casamento, especialmente  solicitado pelo Príncipe William e criado pela McVitie’s Cake Company, com base em uma receita da Família Real. 

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O segundo bolo de casamento do Príncipe William e Catherine Middleton, feito pela McVitie’s Cake Company a pedido do príncipe. (The Royal Family).

O chef Darren McGrady preparava um bolo semelhante para a Rainha, o qual o príncipe adorava.

 “A Rainha adora chocolate, então um de seus bolinhos de chá da tarde favoritos era o bolo de biscoito de chocolate. Sempre que William ia visitar a rainha quando estava no Eton College, ele pedia, então tínhamos que fazer um e levar para Windsor”, relembrou McGrady. “Todos os funcionários também amavam; era o favorito deles. 

O doce foi feito com biscoitos de chá, chocolate e nozes e era congelado, não assado. O Duque de Cambridge surpreendeu a mídia e os britânicos, uma vez que a receita era relativamente popular, mas particularmente incomum em recepções de casamento.

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Este artigo faz parte de uma série especial sobre Casamentos Reais

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Confira os outros artigos e infográficos:

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As Tiaras e Acessórios de Casamento das Noivas Reais de 1840 a 2020:

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Os Buquês de Casamento das Noivas Reais de 1840 a 2020:

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Os Bolos dos Casamentos Reais:

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REFERÊNCIAS

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BBC. Slice of Queen Victoria’s wedding cake sold at auction. Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-europe-jersey-37373425. Acesso em: 6 abr. 2021.

BRITISH PATHÉ. The Royal Wedding Cake 1923. Disponível em: https://www.britishpathe.com/video/the-royal-wedding-cake-1/query/Elizabeth+Bowes-Lyon+wedding. Acesso em: 4 abr. 2021.

EDWARDIAN PROMENADE. Royal Wedding #3: Princess Mary of Teck & Prince George, Duke of York. Disponível em: https://www.edwardianpromenade.com/weddings/royal-wedding-3-princess-mary-of-teck-prince-george-duke-of-york/. Acesso em: 4 abr. 2021.

FOOD & WINE. Why Fruitcake Is Always Served at Royal Weddings. Disponível em: https://www.foodandwine.com/news/why-fruitcake-served-royal-weddings. Acesso em: 4 abr. 2021.

GETTY IMAGES. Etta Richardson Unveiled as the Cake Maker for Prince Charles and Camilla Parker Bowles Wedding. Disponível em: https://www.gettyimages.com.br/detail/foto-jornal%C3%ADstica/etta-richardson-in-llansteffan-with-the-type-of-cake-foto-jornal%C3%ADstica/115368240. Acesso em: 4 abr. 2021.

JSTOR DAILY. England’s Obsession with Queen Victoria’s Wedding Cake. Disponível em: https://daily.jstor.org/englands-obsession-with-queen-victorias-wedding-cake/. Acesso em: 5 abr. 2021.

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