A série The White Queen (2013), produzida pela BBC One em parceria com o canal Starz, é baseada em três livros da escritora Philippa Gregory: The White Queen (sobre Elizabeth Woodville, rainha consorte de Edward IV), The Red Queen (sobre Margaret Beaufort, mãe de Henry VII) e The Kingmaker’sDaughter, (sobre Anne Neville, filha de Richard Neville, conde de Warwick e rainha consorte de Richard III).
The White Queen é de longe a série mais historicamente precisa do canal Starz (que também produziu The White Princess e The Spanish Princess). Mas, por ser baseada em livros que misturam realidade com rumores da época e fantasia, alguns fatos podem confundir aqueles que conheceram e se interessaram pelos períodos York e Tudor através das séries.
Estes artigos especiais abordam os principais momentos de cada um dos dez episódios de The White Queen e esclarece se foram reais, fictícios ou baseados em rumores.
Você pode conferir os artigos sobre cada episódio na lista a seguir:
Episódio 1: Apaixonada pelo Rei
Episódio 2: O Preço do Poder
Episódio 3: A Tempestade
Episódio 4: A Rainha Má
Episódio 5: A Guerra na Própria Pele
Episódio 6: Amor e Morte
Episódio 7: Veneno e Vinho
Episódio 8: Vida Longa ao Rei
Episódio 9: Os Príncipes na Torre
Episódio 10: A Batalha Final
Richard III nomeou O Duque de Buckingham e Lord Stanley para cargos importantes
Fato, mas em momentos diferentes
Richard III: Eu sou o rei legítimo. Vocês são os guardiões do meu reino. São homens em quem eu confio. Sir Robert Brackenbury, agora, Condestável da Torre. Harry Stafford, Duque de Buckingham, Lorde Chamberlain da Inglaterra. Lorde Thomas Stanley, Lorde Condestável da Inglaterra.
As três nomeações que Richard III faz no início do nono episódio estão corretas, mas diferente de The White Queen, não ocorreram no mesmo momento.
Henry Sttaford, Duque de Buckingham, atuou provisoriamente como Lord Chamberlain. Porém, durante o reinado de Richard, o cargo foi oficialmente ocupado Francis Lovell, 1° Viscount Lovell, antigo amigo do rei, do período em que o Duque de Gloucester governava o norte.
Lord Chamberlain era uma posição política como funcionário chefe da corte e integrante do Conselho Privado. A principal atribuição era ser o interlocutor entre o monarca e o Conselho Privado ou Parlamento (como William Hastings). Francis Lovell era responsável por organizar as funções da corte, supervisionar negócios e interesses, presidir encontros entre departamentos, aconselhar nomeações e organizar cerimônias como investiduras, visitas de Estado, Abertura do Parlamento e coroações. Todavia, foi o Duque de Buckingham quem chefiou a coroação de Richard e carregou a comitiva do rei, agindo como Lord Chamberlain nos primeiros momentos do reinado de Richard III.
Henry Sttaford foi nomeado Lord High Constable of England, o sétimo dos Grandes Oficiais do Estado (Great Officers of State), ocupação que o próprio Richard exerceu. O duque também era Master of the Horse (Mestre do Cavalo), membro do ministério e principalmente, comandante do Exército Real. Como comandante do exército, Henry era o grande responsável por quem entrava ou saia da Torre de Londres, considerada um dos prédios mais seguros do reino.
Após a Revolta de Buckingham, Thomas Stanley foi nomeado para o cargo de High Constable. Portanto, ao contrário da série, ambos ocuparam a mesma posição em épocas diferentes.
Robert Brackenbury realmente era o Lord Constable of the Tower, encarregado de proteger e cuidar o edifício quando o dono (o rei ou a rainha) não estivesse presente, e organizar as cerimônias no local (reuniões do Conselho, por exemplo). Consequentemente, Sir Robert deveria defender a capital do reino de um ataque. Assim como Francis Lovell, Robert Brackenbury era um antigo conhecido de Richard e costumava aturar como tesoureiro. Brackenbury recebeu várias nomeações, incluindo xerife de Kent e Master of the Mint (Mestre da Casa da Moeda).
Richard III e a rainha Anne viajaram pelo reino e investiram o filho, Edward de Middleham, como Príncipe de Gales
Fato
Anne Neville: Eles serão leais a nós, Richard. Você é o rei legitimo agora e a Inglaterra irá amá-lo (…). O norte é leal e o sul os seguirá. E quando a hora chegar, investiremos nosso filho como Príncipe de Gales. E a Inglaterra florescerá com a família York novamente.
Richard III: Obrigado, Anne.
Como acontece até os dias de hoje, era comum que o novo monarca visitasse as cidades importantes do reino para que o povo conhecesse o soberano. Richard III e Anne Neville não foram exceção. Fontes contemporâneas afirmaram que Richard foi bem recebido em cada parada. “Os súditos lhe ofereceram moedas apenas para ouvir do rei que ele não queria o dinheiro deles, apenas o amor. O país parecia ansiar por seu governo”.
Em 1º de agosto de 1483, o rei estava em Gloucester (onde em que o Duque de Buckingham se despediu e seguiu para o País de Gales, acompanhado pelo bispo Morton). Richard III passou por Tewkesbury em 4 de agosto, chegou a Warwick no dia 8 e se juntou a Anne Neville, que veio direto de Windsor.
A comitiva real permaneceu uma semana em Warwick, e compreendia o pequeno Conde de Warwick (Edward, filho de George Clarence e Isabel Neville), cinco Bispos, os Condes de Lincoln, Surrey e Huntingdon, os Lordes Stanley, Dudley, Morley, Scrope e Lovell, o Presidente de Justiça, o escocês Alexander Stewart, Duque de Albany (irmão do rei da Escócia, James III) e o Embaixador da Espanha.
Todos partiram para Coventry e depois visitaram Leicester no dia 17 e Nottingham no dia 22. O rei e a rainha chegaram a Pomfret no dia 27 e foram recebidos pelo filho, o pequeno Príncipe Edward, que havia viajado de Middleham para encontrar os pais.
No dia 30, o cortejo entrou em York. O povo de York ficou muito feliz em dar boas-vindas à família real, Richard era muito popular entre eles. Dom Langton, que acompanhou a turnê, escreveu:
Ele satisfaz as pessoas aonde vai, melhor do que qualquer Príncipe, pois muitos homens pobres que sofreram injustiças foram aliviados e ajudados por ele e sua comitiva durante a viagem real. Em muitas grandes cidades e vilas, foram dadas a ele grandes somas de dinheiro, que ele recusou. Na minha verdade, nunca gostei das condições de um príncipe tão bem quanto as dele. Deus o enviou a nós para o bem de todos nós.
Em 8 de setembro, o rei Richard e a rainha Anne caminharam em procissão solene com as coroas na cabeça, para investir o filho, Edward de Middleham, como Príncipe de Gales. O pequeno príncipe, o primo Edward, Conde de Warwick e Galfridus de Sasiola, o embaixador espanhol, foram condecorados. O grupo real deixou York no dia 20 e seguiu por Gainsborough, em direção a Lincoln.
De repente, o rei recebeu a notícia de que o duque de Buckingham acabara de estourar uma rebelião. Foi sugerido que a investidura de Edward foi apressada e desempenha um papel no mistério do destino dos filhos de Eduardo IV ou um golpe político, mas é igualmente possível que Richard planejasse fazer a cerimônia na cidade que era importante para ele, para honraro povo que o amava por tantos anos.
A Torre de Londres foi atacada e os príncipes foram mortos enquanto Richard III estava longe de Londres
Impossível saber
Anne Neville: Richard, o que é isso?
Richard III: Os Rivers atacaram a Torre, enquanto estávamos no norte, a milhas daqui. Sir Robert escreveu para mim.
Anne Neville: Ela conseguiu tirar os príncipes?
Richard III: Eles não são mais príncipes!
Em The White Queen, Margaret Beaufort e Lorde Stanley convencem o Duque de Buckingham a participar de um plano para matar os Príncipes da Torre ao invés de resgatá-los, diferente do que eles planejaram com a rainha Elizabeth Woodville. O destino dos meninos é aberto, não é revelado ao certo quem efetivamente matou os garotos (Na série, Elizabeth enviou um sósia no lugar do Príncipe Richard, Duque de York).
Na vida real, os príncipes realmente desapareceram enquanto Richard III estava viajando pelo reino no verão de 1483 e o destino deles é um dos maiores mistérios da história britânica. É comumente aceito que eles foram assassinados, mas não há nenhum tipo de evidência concreta de que eles tenham sido mortos.
Em 4 de julho de 1483, o rei Richard III e a Rainha Anne se mudaram para os aposentos reais da Torre de Londres, onde já residiam os dois sobrinhos. Devido às questões de ilegitimidade, Edward V, que fora proclamado rei e logo posto de lado, não podia continuar com os títulos de Príncipe de Gales e Duque da Cornualha, somente com os condados que lhe foram conferidos separadamente por Edward IV, os de Pembroke e March.
O pequeno Richard de Shrewsbury não pôde manter o título de Duque de York. O menino também perdeu o direito aos títulos e propriedades que recebeu após o falecimento de Anne de Mowbray, com quem havia se casado anos antes. Os títulos de Norfolk e Nottingham (pertencentes a família de Anne), foram repassados aos representantes das tias de Anne Mowbray e os filhos delas foram nomeados Duque de Norfolk e Conde de Nottingham, respectivamente, em 28 de junho de 1483.
A intenção de Richard III parecia ser manter-se próximo dos sobrinhos e sustentá-los conforme sua posição. “Ele prometeu que iria prover para eles, e assim mantê-los em posição honrosa, de forma que todo o reino estaria contente”.
Os príncipes nunca foram tratados como prisioneiros. Os garotos moravam nos aposentos reais da Torre, onde tradicionalmente os reis de preparavam para a coroação e Edward V esperava ser coroado. Eles foram removidos dos aposentos reais porque os cômodos eram necessários para que Richard e Anne se preparassem para a coroação deles.
Os relatos contemporâneos sustentam que os meninos foram vistos cada vez menos, ainda assim, eles foram vistos se exercitando, atirando com arco e flecha e brincando nos jardins depois da coroação de Richard. Os funcionários foram removidos e substituídos, pois os antigos servos eram vistos como leais a aos Woodville, não a Edward V.
A Torre de Londres não era uma prisão trancada ou um lugar escuro com um caráter sinistro até a era Tudor, quando outros palácios ao longo do Tâmisa passaram a ser os preferidos da realeza e a Torre ganhou reputação brutal (principalmente graças a Henry VIII). O espaço era um palácio real em funcionamento, um lugar movimentado em que Tesouro Real era guardado, reuniões do Conselho realizadas e provisões militares estocadas. Existia um fluxo constante de entregas de alimentos e mercadorias, bem como uma equipe permanente para administrar o Tesouro e as outras funções permanentes do palácio, de modo que dificilmente era um lugar deserto de impossível acesso. Tirar as crianças da Torre ou matá-las eram tarefas difíceis, não impossíveis.
A maneira de começar uma investigação formal de assassinato é levar em consideração a teoria do triângulo do crime: meio, motivo e oportunidade. Todos os possíveis suspeitos possuíam os três, obviamente não para matar pessoalmente, mas para ordenar a morte dos meninos e proporcionar acesso à Torre.
O principal suspeito sempre foi Richard III. A maioria dos historiadores simplesmente o aceitou como culpado sem levar outras pessoas em consideração devido à propaganda Tudor, que tentou a todo custo retratar Richard como “usurpador, corcunda, assassino sanguinário e sem coração”.
Richard assumiu o trono graças ao Titulus Regius. O Parliament Rolls de janeiro de 1484 lembra que o documento foi apresentado a Richard “em nome e em nome das três propriedades deste reino da Inglaterra, isto é, os senhores espirituais e temporais e os comuns”. O documento direcionado a Richard Gloucester reiterava ao duque: “não há outra pessoa viva, exceto você, que por direito pode reivindicar a dita Coroa e dignidade real por meio de herança”.
O Parlamento concedeu a Richard III o título de rei e ele foi coroado e ungido. Todavia, os Príncipes na Torre eram uma ameaça que poderia se tornar perigosa ao governo dele, e segundo parte dos estudiosos, essa é a razão pela qual ele os matou.
Contudo, das várias soluções possíveis para o problema, apenas uma, a mais extrema, era mandar assassiná-los. O que Richard realmente ganharia se acabasse com vida de um menino de doze anos e o irmão de nove? Remover os meninos eliminaria a ameaça de um renascimento da causa de Edward V. Contudo, não é o quadro completo.
Edward nunca foi coroado, embora mantenha o título de rei. Ele não era um rei ungido por Deus como Henrique VI quando foi destituído. Ao reconhecê-lo como um bastardo no Parlamento, os Senhores Espirituais e Temporais e os Comuns renunciaram a essa lealdade.
Nunca existiu lei alguma que impedisse a coração de uma mulher como rainha da Inglaterra (e mais tarde do Reino Unido). Mary e Elizabeth Tudor, netas de Henry VII são exemplos. James I só se tornou rei pela direito da mãe, Mary, Rainha dos Escoceses, a sucessão. A primogenitura masculina significava que o homem mais velho herdava o trono, no entanto, caso existissem unicamente filhas, a mais velha era a herdeira (mudança proclamada somente em 2011 pelo Ato de Sucessão, assinado pela rainha Elizabeth II, que garante primogenitura absoluta, independente do gênero).
Vários títulos eram detidos por direito da mulher. Richard Neville, Conde de Warwick, o kingmaker, só detinha o condado de Warwick pelo direito da esposa, Anne Beauchamp. O irmão de Anne, Henry, morreu com uma filha, outra Anne. Quando ela morreu sem filhos, o título passou para sua irmã Anne como 16ª condessa. O título foi passado ao pequeno Edward de Warwick pelo direito da mãe dele, Isabel Neville, primogênita de Richard Neville e Anne Beauchamp.
A verdadeira questão é que as outras crianças reais não eram menos ameaçadoras do que Edward V e Richard, Duque de York. Henry Tudor recrutou o apoio dos insatisfeitos apoiadores de Edward IV ao prometer se casar com Elizabeth de York, filha mais velha do rei Edward. Foi a promessa que garantiu a coroa para Henry em 1485. O Parlamento fez uma petição para que Henry VII aceitasse que não existia maneira de manter a posição de rei sem Elizabeth, ele gostasse ou não.
Elizabeth de York era uma ameaça para Richard III exatamente como os irmãos dela poderiam ter sido. Se Richard ordenou a morte dos dois garotos poucos meses antes, o curso natural de ação seria terminar o trabalho e decretar o fim da princesa, roubando de Tudor à lealdade daqueles que fizeram juramentos a Henry graças a ela.
Mas matar Elizabeth significaria muito. Henry Tudor poderia simplesmente transferir o juramento para a irmã dela, Cecily. Com o tempo, as outras meninas se tornariam a mesma ameaça. Por que não descartar todas imediatamente?
No entanto, todas as meninas permaneceram vivas e bem. Em março de 1484, Elizabeth Woodville e as meninas saíram do santuário na Abadia de Westminster e foram viver na corte de Richard III como parte de sua família. Richard cumpriu a promessa de mantê-las seguras.
Mesmo que Richard III fosse um assassino calculista e tivesse matado todas as filhas de Edward IV, ainda não teria sido suficiente. George, Duque de Clarence, teve um filho, Edward, Conde de Warwick e uma filha, Lady Margaret. Na ausência das princesas de York, eles teriam se tornado uma ameaça.
Muitos alegam que Richard gostaria que Edward Warwick fosse o herdeiro, apesar da traição do pai dele, George Clarence. Margaret tinha direito a coroa se as filhas de Edward IV tivessem morrido. Ou seja, se Richard quisesse eliminar todos os possíveis rivais, os filhos de George teriam que morrer também. Foi Henry VII quem assassinou judicialmente Edward, Conde de Warwick, e foi Henry VIII quem sucumbiu a paranóia e executou Lady Margaret quando ela era já era uma senhora idosa de 67 anos.
Outros possíveis herdeiros, os filhos Elizabeth de York, Duquesa de Suffolk (irmã de Richard III), John, Edmund, William e Richard de la Pole, também foram mortos durante os reinados de Henry VII e Henry VIII. O destino de William de la Pole foi o pior. Ele permaneceu prisioneiro na Torre de Londres por 37 anos, até a morte.
Richard não matou nenhuma dessas pessoas mesmo com todo o perigo potencial que representavam para ele. Por que é tão fácil acreditar que ele assassinou os Príncipes na Torre? Duas em pelo menos nove ameaças? Por que fazer menos da metade de um trabalho se garantir o trono era a única preocupação? Richard III era considerado extremamente inteligente e não o tipo de homem que faria um trabalho pela metade.
A rebelião no final do verão de 1483 envolvendo o Duque de Buckingham certamente proporcionou a Richard a oportunidade perfeita, se ele desejasse que os meninos morressem: culpar Buckingham, chorar por eles, seguir em frente e unir à nação na tristeza, até mesmo se desculpar por não ter conseguido protegê-los e o problema estaria resolvido. Ele poderia ter inventado uma desculpa qualquer, como Edward IV fez com Henry VI.
O silêncio, caminho que Richard escolheu, era a opção mais difícil. Permitiu que o boato fermentasse e crescesse. A incerteza não era amiga de um rei medieval. Por que então ele escolheu o silêncio? Porque ele achou que não deveria se explicar ou talvez porque não assassinou ninguém e queria que Edward e Richard fossem esquecidos.
Richard III não tinha hábito de se manter em silêncio sobre grandes questões. Quando os rumores sugeriam que ele a estava envenenando a rainha Anne Neville para que pudesse se casar com Elizabeth de York, Richard dirigiu-se “aos grandes e bons de Londres” para negar o rumor. O caminho fácil poderia ter sido ignorar o absurdo e esperar que os boatos sumissem. Richard preferiu enfrentar o assunto de frente e esclarecer tudo.
Diversos pesquisadores presumem que os dois sobreviveram ao reinado de Richard. Uma ordem para a casa do Rei Richard III (instruções para os funcionários que trabalhavam nos palácios reais) datada depois da morte de Edward de Middleham, pedia para que as crianças fossem servidas antes de todos os outros senhores. As únicas crianças que poderiam ocupar tal posição eram os filhos de Edward IV e o filho de George de Clarence. A conclusão seria a de que todos os sobrinhos eram membros da casa do rei, e que só foram enviados para o xerife Hutton e para a Torre de Londres quando a invasão de Henry Tudor ameaçou o reino.
A outra evidência é um mandado no “Foedera” de Rymer, datado de 9 de março de 1485, que instruía Henry Davya a “entregar a John Goddestande, lacaio do Lorde Bastardo, dois doblets de seda, uma vestimenta de tecido, duas camisas e dois gorros.”
Dr. Lingard sugeriu que os documentos se referiam a John de Gloucester, filho ilegítimo de Richard III (nascido antes do casamento com Anne Neville). Porém, John é mencionado na “Foedera” de Rymer simplesmente como filho bastardo do Rei e não como um “lorde”, pois esse título não pertencia a ele.
Edward, por outro lado, mesmo que fosse oficialmente chamado de bastardo, era um lorde. A designação de Lorde era correta. Na “Conta do Guarda-Roupa” ele era chamado de Lord Edward. Como Edward detinha condados de March e Pembroke, ele era denominado Lorde Bastardo. John de Gloucester não poderia ser nomeado lorde, já que não era.
Havia apenas um “Lord Bastard”. Os mandados, portanto, mostrariam que Edward estava vivo e bem em março de 1485. As duas evidências estão de acordo com a declaração de Morton de que o rei Richard declarou a intenção de manter seus sobrinhos em uma posição honrosa.
Elizabeth Woodville pode ter deixado o santuário com a promessa de contato com seus filhos, escondidos em segurança no antigo reduto de Richard, no norte (como é dito que Richard pretendia fazer um The White Queen), entre homens em quem o rei sabia que podia confiar, ou instalados discretamente na corte da tia Margaret, a irmã de Richard, em Borgonha, viajando para Gipping Hall para visitar a mãe.
O principal argumento atual contra Richard III vem de Sir Thomas More, por meio da obra “A História de Ricardo III” (título em português). O livro relata que os príncipes foram sufocados por James Tyrell, Mestre do Cavalo de Richard III, com a ajuda de dois homens, Miles Forest e John Dighton e os corpos foram enterrados ao pé de um lance de escadas na Torre de Londres. William Shakespeare baseou a peça Ricardo III na obra de Sir Thomas e eternizou a reputação de Richard III como vilão.
A história parecia ter sido confirmada pela descoberta dos ossos de duas crianças dentro de uma escadaria na Torre em 1674. Em 1678, os restos mortais foram enterrados como sendo os dos príncipes, na Abadia de Westminster por ordem de Charles II. Entretanto, More reconhece no mesmo livro que posteriormente, um padre pegou os corpos e os enterrou de novo em outro local, que ninguém conhecia porque o padre faleceu.
Em 1933, as ossadas foram exumadas e foi declarado que os ossos das duas crianças eram da idade certa e, portanto, os ossos de Edward e Richard. Com o avanço do conhecimento e com as novas técnicas disponíveis, as conclusões do exame de 1933 são contestadas. As declarações categóricas feitas no relatório do exame, interpretadas por cientistas forenses modernos enfatizam as incertezas na determinação de idade, sexo, relacionamento familiar e data do óbito. As técnicas forenses modernas mostram que as idades estabelecidas para os dois esqueletos são altamente discutíveis e eles podem ser mais jovens do que os príncipes.
A diferença de idade entre os dois parece ser menor do que os três anos que separam os nascimentos de Edward e Richard. Atribuir uma data aos ossos não poderia ser feito em 1933. Usando a datação por radio carbono, é possível atribuir-lhes pelo menos um século e, perto de uma data com uma margem de erro de cerca de 15 anos, saber se são ossos do final da Idade Média.
A falta de inúmeras técnicas em 1933, para estabelecer uma relação entre os dois esqueletos, relação familiar confiável e ao menos uma tentar determinar o sexo das crianças compromete todo o trabalho. Outro fato que ser levado em consideração é o de que várias pessoas desapareceram e foram enterradas na Torre Londres durante séculos e séculos. Muitos corpos foram encontrados ao longo da história, incluindo crianças.
Os outros suspeitos do assassinato tendem a orbitar a causa de Henry Tudor. Se os meninos foram assassinados em 1483, é possível que fizesse parte de uma conspiração para subverter o governo de Richard lançando sobre ele a sombra da culpa e para tentar reforçar a causa de Henry (a exemplo do retratado na série).
O primeiro deles seria, obviamente, o Duque de Buckingham. Henry Sttaford descendia de Edward III de forma legítima e uma reivindicação melhor que a de Tudor. A linha Stafford descendia da filha de Thomas de Woodstock, Duque de Gloucester, filho de Edward III. A mãe de Buckingham era Margaret Beaufort, filha de Edmund, Duque de Somerset e prima de Margaret Beaufort, mãe de Henry Tudor, filha de John Beaufort (irmão de Edmund). Muitos historiadores pensam que Henry Sttaford pode ter matado as crianças para culpar Richard III e deixar que Richard e Henry Tudor se destruíssem para que ele pudesse ficar com a coroa para si mesmo. Por conta da alta posição no governo, ele poderia passar despercebido.
Margaret Beaufort e Thomas Stanley também retinham recursos, meio, motivo e oportunidade para eliminar os príncipes para tornar o caminho mais fácil para Henry VII. Lord Stanley era o Lord High Constable de Richard após a queda de Buckingham. Esse papel deu a Stanley as chaves da Torre de Londres. A perspectiva de ver o enteado agradecido e no trono era certamente suficiente para motivar o crime. Foi o suficiente para que ele traísse Richard no campo de batalha em Bosworth.
Talvez Margaret o convenceu, ou ela mesma ordenou a morte dos garotos pessoalmente. Ela era uma Lancaster convicta que viu Henry VI ser morto e teve o filho mantido longe dela por muitos anos por representar uma ameaça à dinastia York. Margaret Beaufort queria ver o filho rei e teve oportunidade meio e motivo, como Stanley, Buckingham e o próprio Richard III.
Há um claro indicador do trabalho de Margaret Beaufort em favor do filho no final do verão de 1483. A tarefa era profunda, secreta e dependia dos Príncipes na Torre fora do caminho. Foi Margaret quem abriu uma linha de comunicação com Elizabeth Woodville no santuário da Abadia de Westminster e usou o próprio médico e garantiu o acordo com a rainha Elizabeth de que seus filhos deveriam se casar.
O último suspeito claro é o próprio Henry Tudor. Quando se tornou Henry VII, se o rei tivesse descoberto os meninos vivos e bem, teria descoberto um problema real. Tudor tinha jurado se casar com Elizabeth de York para unir as Casas de York e Lancaster. Para fazer isso, ele teve que legitimar novamente todos os filhos do rei Edward IV. Henry perderia o trono para Edward se o menino estivesse vivo. Muito dos apoiadores leais a Edward IV, que lutaram por Henry Tudor se voltariam contra ele a favor de Edward V. Logo, seria do interesse de Henry que os meninos não fossem encontrados com vida.
Henry VII nunca colocou a culpa pela morte dos Príncipes na Torre nos pés Richard III, nem de ninguém. Ele nunca disse uma palavra oficial sobre eles. Teria sido fácil para o rei declarar que as crianças estavam mortas, culpar Richard e dizer que “se vingou” pelos garotos. A rainha Elizabeth de York também nunca disse uma palavra contra o tio. Surpreendentemente, nem mesmo Elizabeth Woodville acusou Richard.
Sir James Tyrell, o homem regularmente acusado de ter matado os príncipes em nome de Richard III e supostamente confessou o crime quando foi preso por traição em 1502, nunca confessou o assassinato, nem foi questionado sobre isso. As acusações são baseadas no livro de Thomas More, que relata exclusivamente rumores, fofocas que “as pessoas diziam” que Richard matou os meninos.
Outras pessoas podem ter assassinado os pequenos em nome de Richard, Henry ou Buckingham, mas é impossível saber quem matou ou por ordem de quem. É possível que o responsável tenha pensado que seu mestre ficaria agradecido e que receberia alguma recompensa. Vários escritores ao longo a história sugeriram diversas causas para a morte de Edward e Richard, entre elas algumas doenças, como doença do suor, muito popular na Inglaterra no século XV ou que Edward IV faleceu de causas naturais, já que ele supostamente sofria de uma grave infecção na mandíbula, capaz de matar, de acordo com essa teoria, o destino do Duque de York continuaria uma incógnita.
O mistério dos Príncipes na Torre provavelmente permanecerá um enigma por muitos anos. Mesmo que se prove que os ossos da Torre são dos meninos, continuaria impossível determinar com certeza quem foi o mandante. É injusto acusar e culpar qualquer um dos suspeitos. Os tribunais modernos seriam obrigados a absolver por falta de provas quem quer que fosse formalmente acusado.
Em 21 de fevereiro de 1984, um júri foi realizado na Corte Criminal Central de Londres para determinar se Richard III era culpado ou inocente da acusação de que: “por volta o mês de agosto de 1483, na Torre de Londres, assassinou o Príncipe Edward, Príncipe de Gales, e o Príncipe Richard, Duque de York”. Richard foi declarado não culpado/inocente. Em 2013, um júri realizado na Universidade de Direito de Indiana, nos Estados Unidos, presidido por William H. Rehnquist, Chefe de Justiça dos Estados Unidos, chegou a mesma conclusão. Se Henry VII, Thomas Stanley ou Henry Sttaford fossem julgados, o resultado provavelmente seria o mesmo.
O Duque de Buckingham se revoltou contra Richard III e participou de uma rebelião ao lado de Margaret Beaufort
Fato
Richard III: É Buckingham. É meu melhor amigo quem está por trás da rebelião de Margaret e Stanley. Eu interceptei as cartas dela. Um homem com tudo para ser leal. Eu dei tudo que ele pediu! Um traidor nunca foi tratado tão bem! Agora ele se une com Elizabeth e Henry Tudor, que deve estar vindo da Bretanha.
Anne Neville: Buckingham é um traidor. Lady Margaret também. Elizabeth nós esperávamos. Mas todos eles juntos?
O primeiro sinal de problema no governo de Richard III foi uma marcha sobre Londres por homens de Kent em 10 de outubro. O Duque de Norfolk lidou prontamente com o levante. Ele capturou e interrogou os líderes e relatou a Richard as notícias perturbadoras que descobriu. No final de setembro, o Duque de Buckingham, até então braço direito do rei, escreveu a Henry Tudor, encorajando-o a invadir. Henry Sttaford deveria liderar uma força para fora do País de Gales, e Tudor deveria desembarcar na costa sul e Kent e marchar sobre Londres. Tudo foi planejado para 18 de outubro. Kent agiu oito dias antes do previsto e alertou as autoridades sobre o complô.
Entretanto, a parte mais importante da Rebelião de Buckingham é como ela foi arquitetada e as consequências para o governo de Richard III. O nome “Rebelião de Buckingham” é impreciso. Henry Stafford foi recrutado para a trama, possivelmente pelo bispo Morton, que estava em prisão domiciliar em Brecknock aos cuidados de Buckingham após o Conselho que viu William Hastings ser executado. Stafford foi um participante, não o instigador da rebelião.
O Bispo Morton parece ter sido quem efetivamente aproveitou toda a situação e aconselhou o duque a agir. Morton odiava Richard profundamente. Lancaster fervoroso, o bispo se reconciliou com o governo de Edward IV depois de Tewkesbury e a “morte” da linhagem de Lancaster. A família de Buckingham também era Lancaster convicta, o avô dele morreu na Batalha de Northampton, lutando por Henry VI. Morton aparentemente atraiu a simpatia dos Lancaster, que passaram a abraçar a revolta.
Inicialmente, os rebeldes declararam que o objetivo da rebelião era garantir a libertação de Edward V e devolvê-lo ao trono, o que foi rapidamente redirecionado para colocar Henry Tudor no trono.
O Duque Buckingham se comprometeu com Richard III, meses antes e foi amplamente recompensado. Consequentemete, as razões pelas quais ele concordou em participar do levante são desconhecidas. Foi sugerido por Virgil, um cronista, que o duque não recebeu parte de uma herança de Bohun, que Edward IV reteve e o novo rei lhe prometeu. O pedido foi de fato feito por Richard e aguardava apenas a aprovação parlamentar.
Outra possibilidade é que Sttaford viu uma chance de tomar o trono para si. Ele era primo de Richard III e Henry VII e possuía sangue real. Ele também era vaidoso e ambicioso, como George de Clarence. Talvez Buckingham não visse Tudor como uma ameaça real e levantou uma grande força para beneficiar si mesmo, com o objetivo de agarrar o poder no meio da confusão. Foi sugerido por vários escritores que o próprio Duque Buckingham mandou matar os meninos na Torre para removê-los, apostando que Tudor não conseguiria nenhum apoio no país e seu próprio caminho para o poder ficaria aberto.
Margaret Beaufort queria o filho de volta e viu uma oportunidade boa demais para perder e fez uma aposta de tudo ou nada que precisaria balancear as probabilidades ao máximo a seu favor. Margaret abriu um canal de comunicação com Elizabeth Woodville na Abadia de Westminster. Incapaz de arriscar visitas pessoais, o médico de Margaret, o Dr. Lewis Caerleon, agiu como intermediário, servindo Elizabeth como médico.
A rainha Elizabeth pediu o apoio dos Rivers e dos seguidores leais de Edward V, apoio à oferta de Henry Tudor ao trono em troca de uma garantia de que Henry se casaria com sua a Princesa Elizabeth de York, tornando-a rainha se ele tivesse sucesso.
O plano final era que Kent atacasse Londres pelo sudeste para chamar atenção de Richard, enquanto os homens de West Country, Wiltshire e Berkshire, apoiados pelas tropas galesas de Buckingham e do exército de mercenários bretões de Henry Tudor formariam uma força imbatível. Com a atenção de Richard em Kent, os rebeldes pegariam o rei quase desprevenido e venceriam.
À medida que a data marcada aproximava (18 de outubro), a rebelião parecia em boa forma. Era uma grande revolta e uma ameaça extremamente perigosa, porém, dependia que tudo ocorresse como planejado.
Alguns dos rebeldes em Kent chagaram muito cedo. Por alguma razão desconhecida, eles marcharam em Londres em 10 de outubro, oito dias antes do previsto. John Howard, Duque de Norfolk, amigo leal de Richard III, rapidamente afastou os rebeldes, capturando o suficiente para obter detalhes da rebelião planejada para a semana seguinte.
Richard estava em Lincoln quando as notícias chegaram a ele, em 11 de outubro. O rei convocou uma reunião em Leicester e partiu para derrotar o resto das tropas. Ordens foram enviadas para que as pontes sobre o rio Severn fossem destruídas, para evitar que Henry Stafford deixasse o País de Gales, ao mesmo tempo em que a região da fronteira foi orientada a resistir a qualquer tentativa de Buckingham de cruzá-la.
Em 18 de outubro, o plano entrou em ação, mas passou a funcionar a favor de Richard. A Inglaterra foi devastada por violentas tempestades (como acontece na série, contudo, Elizabeth Woodville e a Princesa Elizabeth não foram as responsáveis). Choveu por dez dias inteiros, “um sinal do favor de Deus” nos dias em que as pessoas desejavam ver o tempo todo. O rio Severn transbordava e estourava as margens em muitos pontos. Com as pontes descartadas, Buckingham não conseguiu atravessar.
Henry Tudor havia deixado a Bretanha em 2 de outubro, apoiado pelo Duque Francis da Bretanha. Ele pode ter conseguido parte do tesouro de Edward IV, como algumas fontes sugerem. No Canal, a frota de Tudor sofreu com a mesmo temporal e foi altamente castigada. Quando finalmente alcançou a costa sul da Inglaterra, um pequeno grupo de soldados acenou para que desembarcassem, saudando o sucesso da rebelião. Henry não acreditou na notícia e voltou à Bretanha.
Naquele mesmo dia, em 1º de novembro, Henry Stafford foi capturado e entregue ao rei Richard em Salisbury. Buckingham se escondeu com um simpatizante em Shropshire, cuja simpatia evaporou quando o rei colocou um preço substancial pela cabeça do traidor. Edward Stafford, filho de Buckingham, revelou mais tarde que o pai pretendia esfaquear Richard III com uma faca escondida, mas o rei se recusou uma audiência e ordenou a execução do duque no dia seguinte. Buckingham foi decapitado como traidor na praça do mercado de Salisbury em 2 de novembro.
A traição atingiu Richard profundamente. Ele era um homem que seguia os códigos de honra e considerava tal comportamento desonroso e repugnante. O rei escreveu ao chanceler, John Russell, Bispo de Lincoln antes da captura de Sttaford e acrescentou um parágrafo escrito à própria mão, declarando sua indignação:
Ficaríamos muito contentes se você mesmo viesse, se puder, e se não puder, pedimos que não falhe, mas que cumpra com toda a diligência nosso dito comando (…). Aqui, amado seja Deus, tudo está bem e verdadeiramente determinado a resistir à malícia daquele que tinha a melhor causa para seja verdadeiro, o Duque de Buckingham, a mais falsa criatura viva, a quem, com a graça de Deus, não demoraremos até que estejamos naquela região e subjuguemos sua malícia. Asseguramos a você que nunca houve um traidor mais falso e melhor provido, como este portador, de Gloucester, mostrará a você.
Quaisquer que sejam as verdadeiras razões, a rapidez em agir poderia ter deixado Richard III mais forte. Os inimigos do rei se expuseram como traidores para que todos vissem. Henry Sttaford foi o único nobre a se revoltar. Os outros eram ex-legalistas de Edward IV e dos Woodville, ou Lancasters. A sorte certamente desempenhou um papel, já que Kent fracassou no ataque a Londres e as tempestades impediram os inimigos do rei de concretizar os planos.
O norte e o interior permaneceram firmemente leais a Richard III, somente o sul oferecia oposição. Tudo o que faltava era erradicar os resíduos da resistência Lancaster e os aliados de Edward que se juntaram a Henry Tudor. Embora a rebelião de Buckingham tenha fracassado, foi um perigo muito grande e bem organizada, uma enorme ameaça e Richard teve muita sorte de ter sido alertado rapidamente.
Parecia que Richard III havia esmagado decisiva e efetivamente o primeiro levante contra o governo dele. Buckingham foi condenado. Tudor voltou correndo para a Bretanha, mesmo que tenha escapado da captura. Era claro que o Bispo Morton e Margaret Beaufort estavam fortemente envolvidos na trama, e muitos imaginavam que Deus enviara as chuvas para frustrar os inimigos de Richard, provando que ele era o verdadeiro rei, escolhido por Deus.
A forma como Richard lidaria com as consequências da rebelião seria a chave e ele lidou muito mal.
Morton escapou para Flanders e continuou a conspirar. Margaret Beaufort foi encurralada. A resposta do rei a participação dela é notável, especialmente para os que o vêem como tirano. A mãe de Henry VII foi simplesmente deixada em paz. As terras e propriedades foram confiscadas e concedidas ao marido, Thomas Stanley (o mesmo homem que preso como traidor meses antes). Ela foi colocada em prisão domiciliar aos cuidados de Lord Stanley, que deveria se certificar de que ela não fizesse contato com o filho. Foi a misericórdia de Richard, e talvez a ingenuidade, que selou seu destino.
A Rebelião de Buckingham pode ter sido um fino véu desenhado para trama Tudor. O nome de Buckingham foi atribuído para proteger os outros porque somente a vida dele foi perdida. A oposição e o ressentimento com o governo de Richard III no sul aumentaram quando ele reagiu à revolta no local, plantando os leais aliados do norte no sul.
Se os nobres temiam que o rei forçasse os amigos do norte a entrar na região, eles tiveram certeza quando Richard fez exatamente o que eles temiam: tirou terras, dinheiro e poder da nobreza da região, uma atitude considerada correta pelo resto do país, apesar disso, é possível que o descontentamento contra Richard no sul foi provocado deliberadamente, plantando e cultivando oposição a fim de colher apoio para Henry. Demorou dois anos.
Elizabeth Woodville e Margaret Beaufort planejaram o casamento entre Henry Tudor e a Princesa Elizabeth de York.
Fato
Richard III: Henry está prometido a Elizabeth, nossa sobrinha.
Anne Neville: Como sabe?
Richard III: Stanley contou.
Em The White Queen, Elizabeth Woodville recebeu a informação de que O Duque de Buckingham queria “mudar de lado em troca da filha dele se casar com Edward e ele seja feito regente até Edward crescer”. Na vida real, os planos sempre foram que Henry Tudor se casasse com Elizabeth de York.
O canal de comunicação entre Margaret Beaufort Elizabeth Woodville por meio do médico Lewis Caerleon permitiu que as duas combinassem e apoiassem a revolução contra Richard III e pensar em qual seria o futuro das princesas e dos Woodville caso o esquema fosse bem sucedido, ou até mesmo adiado (como aconteceu). O casamento uniria as Casas de York e Lancaster.
Elizabeth de York era uma princesa valiosa para todos que queriam lutar contra o rei e ganhar o apoio dos mais leais a Edward IV. Com o desaparecimento dos príncipes na Torre, Elizabeth era a legítima herdeira de Edward e a Inglaterra permitia uma mulher no trono. Mas ela não detinha recursos para lutar sozinha, se desejasse.
Henry Tudor era a última esperança Lancaster. A reivindicação de Henry ao trono erafrágil, praticamente inexistente. Os pais dele se casaram quando a mãe, Margaret, era uma adolescente de 12 anos e o pai, Edmund Tudor, 24. Edmund era meio-irmão materno de Henry VI e morreu antes do nascimento do filho. A mãe de Edmund Tudor era viúva de Henrique V, Catherine de Valois, princesa francesa e rainha consorte de Henry V. Isso significava que ele possuía sangue real francês, todavia, a Salic Law impedia a sucessão femininana França. O avô de Henry, o segundo marido de Catherine, era Owen Tudor, de nascimento simples.
Lady Margaret Beaufort descendia da linha bastarda de Edward III e qualquer direito que Henry Tudor possuísse a coroa vinha da parte dela. A história de Margaret e as informações sobre a família dela estão disponíveis aqui (link do episódio seis, que explora o relacionamento dela com a família).
Com o fracasso da Rebelião de Buckingham, Henry Tudor evitou Richard e voltou para a Bretanha. Richard III abriu negociações em 1484 para que Tudor fosse entregue em troca do fornecimento de arqueiros ingleses para ajudar a Bretanha a se defender da França. A notícia do plano chegou a Henry , que escapou pela fronteira da França.
A corte da francesa, sob o comando do filho de Louis XI, Charles VIII, deu as boas-vindas a Henry Tudor. Os franceses possivelmente se lembraram do desejo de Richard por uma batalha em solo francês e viram Tudor como uma alternativa bem-vinda. Quando o capitão da guarnição de Calais desertou, levou consigo John de Vere, 13º conde de Oxford. O conde era o comandante militar Lancaster mais experiente vivo, um oponente formidável. O impensável se tornou inevitável, Henry estava prestes a lutar efetivamente para ser rei, mas precisava de alguém com direito inquestionável ao trono, Elizabeth de York.
A intenção de Henry em se casar com Elizabeth foi declarada oficialmente no Natal de 1483, na Catedral de Rouen, na França. Ao expor objetivo publicamente, ele conseguiu a simpatia dos seguidores de Edward IV, dos Woodvilles e dos Lancaster que desistiram de qualquer expectativa depois da Batalha de Tewkesbury.
A primeira licença papal para o casamento entre Henry VII e Elizabeth de York foi expedida em Roma em 1484. Quando ele se tornou rei, uma segunda licença foi expedida e eles se casaram em 18 de janeiro de 1486.
Eles viveram um casamento feliz, que gerou oito filhos. Entre eles Arthur, Príncipe de Gales, Margaret, rainha da Escócia, Henry VIII (antes Duque de York) e Mary, rainha da França. As outras crianças faleceram na infância.
Elizabeth se reconciliou com Richard III e enviou as filhas mais velhas à corte.
Fato
Richard III: Pense, Elizabeth. Quando matamos o rei Henry, mostramos seu corpo ao povo. O objetivo era dizer ao que a linhagem dele havia acabado. Se eu tivesse matado seus filhos, teria feito o mesmo. Lamento pela sua perda. Você não tem nada a ganhar ficando no santuário. Farei um acordo e prometo a sua segurança e de suas filhas.
Richard III tentou por muito tempo negociar com a rainha Elizabeth Woodville. O pedido dele era que a rainha e as filhas deixassem o santuário na Abadia de Westminster. Se ela o aceitasse como rei, ele trataria as princesas de forma honrosa e gentil, como membros da nobreza.
Richard prometeu manter as meninas seguras e negociar casamentos adequados para as elas, afinal as princesas eram filhas de um monarca. Elizabeth concordou com os termos e o rei se comprometeu a pagar 700 marcos por ano como pensão à rainha viúva.
Em março de 1484, Elizabeth Woodville saiu da Abadia com as filhas e elas foram viver na corte de Richard III como parte da família. Richard cumpriu a promessa de mantê-las seguras. Elizabeth foi viver em uma casa de campo com as princesas mais novas e enviou uma carta para Thomas Gray, Marquês de Dorset, pedindo para que ele voltasse da França e aceitasse o novo rei (no episódio oito, Thomas partiu com o Príncipe Richard e procurava um lugar seguro para esconder o irmão). As meninas mais velhas, Elizabeth e Cecily, foram viver na corte de Richard III e da rainha Anne.
Os defensores de Richard defendem que a rainha Elizabeth não teria aceitado a oferta se soubesse que o rei era responsável pelo assassinato dos príncipes na Torre. Talvez ela soubesse quem eram os verdadeiros responsáveis, ou pensava que eles estavam vivos em bem. Tudo não passa de especulação, porém, alguns historiadores acreditam na mesma versão que a série apresenta. Se Richard tivesse ordenado a morte dos meninos, ele teria encontrado uma forma de provar que a linhagem masculina de Edward IV chegou ao fim.
Richard III foi obrigado a adiar a Abertura do Parlamento por conta da Rebelião de Buckingham
Fato
Richard III: Terei que adiar meu parlamento. Justo quando estava tudo pronto. Eu só quero mostrar a Inglaterra que rei que posso ser e como eu planejo servi-los.
Anne Neville: E você ainda vai mostrar.
O rei Richard III teve apenas um Parlamento, aberto em 23 e janeiro de 1484. Incialmente, a data marcada era 6 de novembro de 1483, pouco depois da Rebelião de Buckingham. Se Richard, como em The White Queen, queria que o reino pudesse ver como ele seria como rei, ele certamente conseguiu. Sir Francis Bacon, chanceler do rei James I, escreveu que Richard era: “um bom legislador, para o conforto e consolo das pessoas comuns”.
O programa legislativo de Richard III era fascinante. É possível enxergar Richard como um dos primeiros reformadores sociais. Ele defendeu a causa das pessoas comuns durante o tempo como governador do norte e não se esquivou de desmantelar antigos direitos da nobreza. Contudo, propor reformas em escala nacional era uma questão totalmente diferente.
A nobreza da Inglaterra tinha grande interesse no status quo, que os mantinha ricos, poderosos e confortáveis. Era improvável que eles saudassem qualquer balanço no modo tradicional da Inglaterra feudal. Richard procurou semear as sementes da mudança, ideias inovadoras e boas intenções, mesmo que fossem poucos convincentes para época.
O primeiro fato surpreendente sobre o Parlamento de Richard é que os Atos foram publicados em inglês. A lei inglesa sempre foi reservada aos ricos e instruídos, à Igreja e à nobreza que sabiam ler em latim. Richard publicou suas leis em inglês para que todos tivessem acesso a elas. A taxa de alfabetização ainda não era alta, mas proporcionava acesso e compreensão da lei para o homem comum. Com este presente para os plebeus, veio à remoção de um privilégio longamente guardado da nobreza e da Igreja e eles provavelmente se ressentiram disso.
O Parlamento passou 33 estatutos no total. O Titulus Regius detalhou o direito de Richard ao trono. A maioria dos Atos foram particulares e envolveram rebeliões e traições, resolveram direitos de herança e proveram benefícios para indivíduos.
As benevolências (demanda real por dinheiro que não fora sancionada pelo Parlamento), das quais Edward IV explorou amplamente e com sucesso e eram profundamente impopulares, foram abolidas. O Ato afirmava que: “Os súditos deste reino não deverão ser acusados de quaisquer benevolências”. A ação foi muito popular com a nobreza e com os comerciantes, que se sentiram mais confortáveis para investir o dinheiro sem a ameaça de ter que ceder como presente para a Coroa. O feito foi também a declaração da intenção de Richard de administrar as finanças da Coroa com responsabilidade, para não precisar recorrer a benevolências.
O Parlamento de Richard fez diversas reformas no sistema judicial para lidar com corrupção, incluindo o suborno prevalente de júris. O sistema de fiança foi estendido e reforçado para prevenir que uma pessoa fosse aprisionada antes do julgamento e protegia os bens e propriedades antes que ela fosse declarada culpada. Até então, uma acusação falsa apreendia o indivíduo na cadeia e confiscava todo o patrimônio. Mesmo que a pessoa fosse declarada inocente, os bens não eram devolvidos. Richard consertou as injustiças que viu nas leis, certamente por conta da experiência que adquiriu no norte.
Outros Atos protegeram os mercadores ingleses da competição internacional e diziam respeito à indústria de tecidos e ao ofício de alnage (supervisão da forma e qualidade dos tecidos de lã fabricados). Os autos ordenavam que dez varas de arco fossem importadas com cada barril de vinho maltês e decretavam o tamanho dos barris para vinho e azeite.
Os comerciantes italianos e artesãos estrangeiros eram os principais alvos. O Parlamento de Richard proibia a importação de uma grande variedade de pequenos produtos manufaturados, pedia que os comerciantes estrangeiros gastassem os lucros das vendas em produtos ingleses e cedia o direito limitado para estrangeiros aceitarem aprendizes que não fossem ingleses. Londres recebeu as notícias com alegria.
A ressalva conspícua a essa legislação era que o comércio de livros e seus artesãos não deveriam ser afetados de forma alguma – a educação e o aprendizado eram protegidos. Embora não seja mencionado especificamente, a impressão era protegida. A nova habilidade estava bem estabelecida na Inglaterra, especialmente em Londres, e é provável que os estatutos de Richard tenham sido os primeiros a serem impressos, e os livros impressos no exterior (em latim e francês) inundavam o país. O acesso a informação era uma das prioridades do rei.
É impossível saber o quão longe as reformas de Richard III teriam ido se ele tivesse tido mais tempo, mas é notável o impacto do primeiro e único Parlamento dele. É possível ver que muitas das ideais que o rei havia aplicado no norte foram ampliadas para o âmbito nacional, um grande marco. Eram ideais modernos para a Idade Média e partes das convicções de Richard foram a base para o mundo moderno, principalmente no sistema jurídico.
Quase quarenta anos depois, quando o Cardial Wolsey tentou extrair benevolências dos cidadãos de Londres em nome de Henry VIII, os londrinos e o prefeito da cidade confiantemente se basearam no estatuto imposto por Richard III. Quando Wolsey alegou que eles seguiam as leis de um usurpador e assassino, o homem supostamente respondeu: “Ele pode ter feito maldades, mas muitos bons atos foram estabelecidos no tempo dele”. Mathew Lewis, autor do livro A Glimpseof Richard III escreveu:
Parece que a única coisa que até os detratores de Richard concordam, é que ele foi um criador de boas leis para o benefício de seu povo.
REFERÊNCIAS
ATTREED, Lorraine C. Medieval children and mortality: From Pearl maiden to Princes in the Tower. THE RICARDIAN, London, v. 5, n. 74, p. 390-395, set/1981. Disponível em: http://www.thericardian.online/downloads/Ricardian/5-74/05.pdf. Acesso em: 30 ago. 2020.
BALDWIN, David. Elizabeth Woodville: Mother of the Princes in the Tower (English Edition). 2. ed. The History Press: eBook Kindle, 2011.
BREVERTON, Terry. Richard III: The King in the Car Park. 2. ed. Stroud, Gloucestershire: Amberley Publishing, 2015.
BRITISH BROADCASTING CORPORATION. The Trial Of King Richard The Third. Disponível em: https://youtu.be/6-kQoKt2Kf4. Acesso em: 8 set. 2020.
DEAN, Kristie. The World of Richard III. 1. ed. Stroud, Gloucestershire: Amberley Publishing, 2015.
GILL, Louise. Richard III and Buckingham’s Rebellion. 1. ed. Stroud, Gloucestershire: Sutton Pub Ltd, 1999.
HAMMOND, P H. The Bones of the “Princes” in Westminster Abbey. THE RICARDIAN, London, v. 4, n. 52, p. 22-25, mar./1976. Disponível em: http://www.thericardian.online/downloads/Ricardian/4-52/06.pdf. Acesso em: 1 set. 2020.
HAMMOND, P W; FUCHS, Livia Visser; WIGRAM, Isolde. Richard III and the Princes. THE RICARDIAN, Stroud, v. 9, n. 116, p. 211-221, mar./1979. Disponível em: http://www.thericardian.online/downloads/Ricardian/9-116/05.pdf. Acesso em: 30 ago. 2020.
HISTORY EXTRA . Did Richard III murder the princes in the Tower? You debate. Disponível em: https://www.historyextra.com/period/medieval/did-richard-iii-murder-the-princes-in-the-tower-you-debate/. Acesso em: 26 ago. 2020.
JOHNSON ASTILLS. The Jury in the Trial of King Richard III are asked ‘Guilty or Not Guilty’….. Disponível em: https://www.johnsonastills.com/site/blog/ejablog/the-jury-in-the-trial-of-king-richard-iii-are-asked-guilty-or-no. Acesso em: 26 ago. 2020.
KENDALL, Paul Murray. Richard the Third: The Great Debate. 5. ed. eBook : W. W. Norton & Company, 1955.
LEWIS, Matthew. A Glimpse of King Richard III. 1. ed. eBook Kindle, 2013.
LEWIS, Matthew. A Glimpse of The Wars of the Roses: (English Edition). 1. ed. eBook: Kindle, 2013.
LICENCE, Amy. Anne Neville: Richard III’s Tragic Queen. 1. ed. eBook Kindle: Amberley Publishing, 2013.
MACGIBBON, David. Elizabeth Woodville: A Life : The Real Story of the ‘White Queen’. 1. ed. Amberley Publishing, eBook Kindle, 2013.
MARKHAM, S. C. R. Richard III: His Life & Character: Reviewed in the Light of Recent Research [llustrated]. 1. ed. London, Waterloo: eBook Kindle, 2011.
MATT’S HISTORY BLOG. Why Is It Called Buckingham’s Rebellion?. Disponível em: https://mattlewisauthor.wordpress.com/2014/08/23/why-is-it-called-buckinghams-rebellion/. Acesso em: 17 ago. 2020.
NORTON, Elizabeth. Margaret Beaufort: Margaret Beaufort. 1. ed. E-book: Amberley Publishing, 2010.
STARZ. The White Queen (A Rainha Branca) Episódio 9: Os Príncipes na Torre. Disponível em: https://www.starz.com/br/pt/play/18890. Acesso em: 20 jun. 2020.
STRICKLAND, Agnes. The True Story of the “White Queen”: Elizabeth Woodville. eBook Kindle, 1893.
SUSAN L. TROXELL. THE TENTH COIN: Richard’s III Parliament and the Public Statutes. jan./2013. Disponível em: http://www.r3.org/wp-content/uploads/2013/07/Rebuttal-Richard_s-Parliament-Laws.pdf. Acesso em: 1 set. 2020.
WYLIE, J. A. H. The Princes in the Tower, 1483: Death from natural causes?. THE RICARDIAN, London, v. 7, n. 91, p. 178-182, dec./1985. Disponível em: http://www.thericardian.online/downloads/Ricardian/7-91/04.pdf. Acesso em: 30 ago. 2020.